Estátua de Stalin é inaugurada em estação de metrô de Moscou, reacendendo polêmicas sobre seu legado. Reprodução: Globo
A reabertura de uma nova estátua de Joseph Stalin em uma estação de metrô de Moscou traz à tona intensos debates sobre o legado do ditador e suas implicações para a memória coletiva da Rússia. Após quase seis décadas, o líder soviético, cuja notoriedade é marcada pela brutalidade, volta a ser uma figura reverenciada por parte do público, refletindo um esforço do Kremlin para reescrever a história russa em momentos de conflito.
Localizada em uma das estações mais ornamentadas, a nova escultura mostra Stalin rodeado por trabalhadores e crianças, simbolizando a adoração que lhe era conferida. A instalação, que imita uma estátua removida em 1966 durante o processo de desestalinização, rapidamente se tornou um ponto turístico, com visitantes deixando flores e posando para fotos.
Esse movimento de reabilitação de Stalin é parte de uma narrativa mais ampla impulsionada pelo governo, que busca glorificar a história russa entre os atuais desafios, especialmente a guerra na Ucrânia. Liliya A. Medvedeva, uma aposentada de 75 anos, expressou seu contentamento com a reinstalação da estátua, afirmando que "vencemos a guerra graças a ele". No entanto, a visão positiva de Medvedeva é contrastada por vozes críticas, que denunciam a tentativa de apagar atrocidades cometidas sob o regime stalinista.
Estudantes e jovens como Vladimir, de 25 anos, expressam temor ao expor suas opiniões sobre Stalin, referindo-se ao ditador como um "tirano sangrento". As memórias dos massivos expurgos e das deportações forçadas que marcaram sua liderança colocam em evidência a divisiva figura de Stalin na sociedade russa contemporânea. Apesar de seu papel em levar a União Soviética à vitória na Segunda Guerra Mundial, muitos reconhecem a destruição e os sofrimentos causados por suas políticas autoritárias.
Desde a ascensão de Vladimir Putin ao poder, o número de monumentos em homenagem a Stalin tem crescido, especialmente após a invasão da Ucrânia em 2022. Este fenômeno inclui a instalação de uma estátua em Melitopol, atualmente sob controle russo, destacando uma ressignificação do passado soviético em tempos de crise. Contudo, a nova estátua do metrô se destaca pela sua localização, onde milhares de moscovitas transitam diariamente.
Yelena Roshchina, de 79 anos, também compartilhou suas lembranças sobre a morte de Stalin, apontando o risco de uma visão unilateral da história. "Não devemos ir a extremos", afirmou, referindo-se ao esforço do Kremlin em equilibrar a memória das repressões de Stalin e a crítica à intelectualidade liberal. O próprio Putin, em várias ocasiões, admitiu os crimes do regime, embora tenha se mostrado relutante em condenar totalmente o passado stalinista.
Com a fundação do Museu de História do Gulag em 2001, a Rússia tentou abordar os horrores do passado, mas um movimento oposto se intensificou nos últimos anos. Instituições como O Memorial, voltado para direitos humanos, enfrentaram crescente repressão, culminando na dissolução da organização em 2021. Historicamente, movimentos que criticam o stalinismo têm sido deslegitimados, como demonstrado pelo caso de Yuri A. Dmitriev, que foi condenado por acusações consideradas duvidosas por seus apoiadores.
A reestalinização da Rússia é vista como um movimento perigoso, não apenas por suas implicações sociais, mas também pelo potencial de se voltar contra o próprio governo. Lev Shlosberg, político da oposição, alertou que a reabilitação de figuras históricas como Stalin poderia trazer consequências nefastas para o regime atual. Recentemente, um ativista apresentou um cartaz de protesto em frente à nova estátua, destacando citações de Putin que criticam os métodos de Stalin, um gesto ousado em um ambiente onde críticas ao governo podem ser severamente punidas.