A recente prisão do MC Poze do Rodo trouxe à tona intensos debates sobre a narcocultura e a relação do tráfico de drogas nas favelas do Brasil. Acusado pela polícia de apologia ao crime, o artista representa um gênero musical que polariza opiniões entre a sociedade e os estudiosos, levantando questões sobre a realidade vivida nas comunidades e o papel do Estado na dinâmica do crime.
No dia 3 de maio de 2025, uma multidão se reuniu no baile da favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, Rio de Janeiro. Sob a grande lona azul, branca e vermelha, a festa foi marcada pela presença de armas de guerra e pela exaltação ao Comando Vermelho, organização criminosa que controla a área. Os participantes levantavam os braços em sinal de cumprimento, enquanto as letras das músicas de funk ecoavam, refletindo a vivência dos moradores.
Após ser preso por tráfico e apologia ao crime, MC Poze foi solto quatro dias depois, em meio a aclamações de fãs e uma celebração que incluía a figura de Oruam, filho de um dos líderes do CV. O evento não só levantou discussões sobre a influência do crime na música, mas também sobre como a cultura é moldada por essas interações. Para muitos, a convivência com a violência e as armas leva o canto a se tornar um reflexo doloroso da realidade.
O termo “narcocultura” foi usado pelo secretário de Polícia Civil, Felipe Curi, para descrever o fenômeno crescente da apropriação da cultura popular pelos traficantes, gerando um foco de crítica e estudo. Pesquisadores argumentam que a luta pelo espaço nas favelas entre as facções criminosas e a população civil torna a música não apenas uma forma de expressão, mas também um instrumento de controle social.
O professor David Maciel, da Universidade Estadual do Norte Fluminense, aponta que a evolução do tráfico como um “empreendedorismo violento” interferiu nas estruturas sociais e econômicas da comunidade. O tráfico de drogas não é mais apenas uma questão de segurança pública, mas também um elemento que transforma a economia e a cultura local, normalizando a violência entre os jovens das comunidades afetadas.
A historiadora Juliana Bragança ressalta que associar o funk à narcocultura pode ser uma abordagem simplista que ignora as causas mais profundas. Com seu livro "Preso na Gaiola", ela argumenta que a tentativa de criminalizar o funk resulta da guerra às drogas do Estado, que muitas vezes fornece combustível para o que torna-se uma expressão cultural dentro das favelas.
Por sua vez, o advogado criminalista Reinaldo Santos de Almeida defende que a intenção por trás das letras deve ser discutida; criminalizar é uma abordagem limitada se considerarmos a importância da expressão artística emergente das comunidades marginalizadas. Esta diversidade de opiniões reflete uma sociedade em busca de entender as complexidades do que é ser jovem, pobre e artista em meio a um cotidiano marcado por conflitos e opressão.