O preço do café moído caiu 2,17% em agosto em relação a julho, marcando o segundo mês consecutivo de recuo após um ano e meio de altas. Dados do IBGE mostraram a variação, que não impede, contudo, que a tendência de valorização retorne nas próximas semanas. A Abic, baseada em informações de duas grandes empresas do setor, estima alta entre 10% e 15% no curto prazo, ainda que o movimento de queda recente tenha pego o consumidor de surpresa.
Queda recente e sinais de recuperação futura
No campo, as cotações, que vinham caindo desde março, voltaram a subir desde o início de agosto. A colheita foi menor que o estimado, e o mundo não tem conseguido repor os estoques após quatro anos consecutivos de problemas climáticos nas principais regiões produtoras. Esse peso de oferta vem elevando a pressão sobre o preço do café na bolsa e, sobretudo, no preço ao consumidor brasileiro.
O cenário internacional se ancora em diversos pilares: a demanda global segue firme, mas os estoques já estavam baixos antes das quedas recentes; o mercado é sensível a eventos climáticos, geopolíticos e à disponibilidade de café arábica, que representa a maior parte da produção brasileira.
Fatores que influenciam o preço no curto prazo
O recuo no campo contrasta com a pressão de alta gerada por fatores estruturais que afetam a oferta mundial. Entre as razões apontadas estão a concretização do tarifaço de 50% dos EUA sobre o café brasileiro, que empurrou o preço para cima na bolsa de Nova York; os baixos estoques globais resultantes de quatro anos seguidos de queda na colheita, impulsionados por problemas climáticos; e a queda na produção brasileira de café arábica neste ano. Além disso, geadas no Cerrado Mineiro causaram um prejuízo de 424 mil sacas (aproximadamente 25 mil toneladas), segundo a StoneX Brasil.
- Tarifaço de 50% nos EUA elevando o custo do grão no mercado internacional;
- Estoques globais baixos devido a secas e geadas persistentes;
- Produção brasileira de arábica em queda neste ano;
- Geadas no Cerrado Mineiro com perdas expressivas na safra.
Essa elevação no preço no campo ocorre, em parte, porque a indústria está pagando mais caro pelo café vindo das fazendas. A transferência de valores para o consumidor não ocorreu de forma homogênea, sobretudo por impactos geopolíticos e logísticos que restringem o fluxo entre campo e varejo.
A tarifaça e as identidades do mercado
Até o início de agosto, o tarifaço ainda não havia provocado altas nas cotações do café no campo brasileiro nem na bolsa de Nova York. O mercado aguardava, segundo o analista da StoneX Brasil, Fernando Maximiliano, a possibilidade de o café entrar na lista de produtos isentos do tarifário, como ocorreu com o suco de laranja. “Afinal, mais de 30% do grão consumido nos EUA sai do Brasil”, afirma Maximiliano. Como o café ficou de fora, a cotação disparou na bolsa diante da expectativa de redução da oferta dentro dos EUA.
“Mais de 30% do grão consumido nos EUA sai do Brasil. Como o café ficou fora da lista, a cotação do produto disparou na bolsa, diante da expectativa de redução da oferta dentro dos EUA.” — Fernando Maximiliano, analista da StoneX Brasil
O analista aponta que o excedente de café destinado aos EUA tende a ser redirecionado para outros destinos. Em sua visão, exportadores brasileiros devem começar a vender mais café para a Europa, já que grandes produtores como a Colômbia devem direcionar mais grãos para atender a demanda norte-americana, reduzindo disponibilidade para o mercado europeu.
Impactos na produção e na qualidade do grão
Há muito tempo o brasileiro convive com preços elevados, e a explicação, segundo Maximiliano, tem um viés estrutural. Os principais produtores — Brasil, Vietnã e Colômbia — enfrentam problemas climáticos desde 2020, o que dificulta restabelecer uma produção ampla para atender a demanda global e repor estoques. “Este é um problema persistente e que só será superado com uma safra grande no Vietnã, na Colômbia e, principalmente, no Brasil, que é o país que mais coloca café no mundo. Mas não é o que vai acontecer com a gente este ano”, alerta o analista.
O diretor-executivo da Abic, Celírio Inácio, complementa que a expectativa inicial era de boa safra, porém a realidade revelou contratempos. Ao final da coleta, com a colheita já em estágio avançado, foram observados dois problemas: menor volume e rendimento inferior. “Nesse caso, é preciso mais grãos para encher uma saca de 60 kg, o que também faz o preço subir.” A safra brasileira de café arábica, por exemplo, deve registrar queda de 18,7% neste ano, em comparação a 2024, segundo estimativas da StoneX Brasil.
Maximiliano ainda lembra que as quedas de produção entre 2020 e 2024 decorreram de secas e geadas severas. Esse conjunto de eventos fez o preço da saca de arábica saltar de cerca de R$ 600, em 2020, para aproximadamente R$ 2.500 este ano. O repasse dessas altas ao consumidor final é quase inevitável, a menos que o setor encontre um caminho para aumentar a oferta sem elevar tanto os custos, afirmou o analista.
Perspectivas de preço para o curto e médio prazo
Com o conjunto de fatores em jogo, o cenário aponta para uma recuperação de preços no Brasil nas próximas semanas, na casa dos 10% a 15%, conforme a leitura de especialistas e dados do setor. A estimativa também leva em conta que o quilo do café deve voltar aos patamares de dezembro, quando chegou a cerca de R$ 80 por quilo. O movimento, no entanto, depende da continuidade dos eventos climáticos nas principais regiões produtoras e de como os mercados reagirão a possíveis mudanças na política comercial dos grandes compradores internacionais.
Ressalta-se ainda que outros elementos, como custos logísticos, câmbio e demanda de grandes compradores, podem modular esse repasse ao varejo. Enquanto isso, o Brasil trabalha para manter o equilíbrio entre demanda interna e exportações, buscando estratégias para mitigar o impacto de safras abaixo do esperado. Se as condições climáticas em Vietnã, Colômbia e, principalmente, no Brasil, melhorarem, o cenário de preços poderia se estabilizar, mas a recuperação pode exigir tempo e investimentos contínuos em manejo, irrigação e melhoria de plantações.