Porto Alegre, RS — A Santa Casa de Porto Alegre atingiu dois marcos históricos em setembro: o milésimo transplante renal pediátrico realizado pela instituição e 30 anos desde o primeiro transplante cardíaco no hospital. O feito reforça a posição da unidade como referência em transplantes no Rio Grande do Sul, mas também evidencia desafios persistentes, como a recusa de famílias em doar órgãos e a fila de espera por órgãos.
Marcos históricos e números-chave
A instituição destaca que, ao longo das décadas, evoluíram os procedimentos e os resultados. Dados citados pela equipe mostram que, no estado, 15 pessoas aguardam por um coração e 1.486 por um rim. Ainda segundo a equipe, a taxa de rejeição de tecidos hoje é significativamente menor do que no passado, reflexo de avanços no manejo imunológico.
Também é ressaltado que o serviço de Transplante Cardíaco da Santa Casa teve início em 1995. Nos últimos dois anos, conforme destacado pela equipe, foram realizados 15 transplantes cardíacos, reforçando o papel da instituição na disseminação de práticas de alta complexidade.
Clotilde Druck Garcia, chefe da Nefrologia Pediátrica, descreve a evolução médica: “Na década de 70, a rejeição era metade dos casos. Hoje, menos de 10%. Temos um arsenal de medicações e escolhemos a melhor para cada paciente.”
Apesar dos avanços, a disponibilidade de órgãos continua sendo um desafio. “46% dos potenciais doadores não se efetiva por recusa das famílias”, afirma Joana Junqueira, coordenadora do serviço de Transplante Cardíaco. A direção reforça que os dados refletem um cenário nacional e estadual de busca por soluções para reduzir as filas de espera.
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Histórias de Isaac e Ademar
O milésimo transplante renal pediátrico tem como um dos protagonistas Isaac Nunes, que recebeu o rim em 2017, após quatro anos de tratamento. Hoje, aos 13 anos, ele sonha em ser programador ou professor de matemática. Raquel Nunes, mãe de Isaac, recorda o início da jornada:
“É bem desafiador porque é uma coisa nova. A palavra que define é medo: do desconhecido, do que vai acontecer.”
Uma semana após a cirurgia, Isaac já mostrava sinais de recuperação: não comia, usava sonda, e pouco depois perguntou o que a família estava comendo. Essa evolução é citada pela família como marco significativo, evidenciando o impacto de um transplante bem-sucedido na qualidade de vida de uma criança.
Outra história marcante é a de Ademar Lagranha, que recebeu um novo coração em 2020, em plena pandemia de Covid. Em 2012, ele descobriu que tinha miocardiopatia dilatada; no fim de 2019, a condição piorou significativamente e ele entrou na fila de transplantes. “Foi em 2012 que eu descobri que tinha miocardiopatia dilatada. No final de 2019, comecei a piorar muito e entrei na fila. A doutora disse que meu único remédio era o transplante”, relembra. Hoje, aos 65, comemora o aniversário e o dia do transplante, afirmando:
“Me sinto com 30 anos. Posso fazer de tudo. Essa é uma nova vida.”
As histórias de Isaac e Ademar ilustram a importância de manter o esforço institucional e familiar para ampliar o acesso a tratamentos que salvam vidas. Dados da Santa Casa indicam que o programa transplant existe como um marco institucional com impacto direto na vida de pacientes pediátricos e adultos, respectivamente.
Incentivo à doação e perspectivas futuras
Para reduzir a fila de espera, desde 2023 é possível registrar a vontade de doar órgãos pela internet, com validade em todo o país. “Quando a família vê que a pessoa manifestou esse desejo, fica mais fácil autorizar”, explica Rita Bervig, presidente do Colégio Notarial do RS. Mais de 850 gaúchos já fizeram a declaração; o registro também pode ser feito gratuitamente em tabelionatos do estado.
Hoje, a Santa Casa reforça o papel de instituição preocupada com a vida de crianças e adultos. O caminho continua dependente de ampliar a doação de órgãos, melhorar a educação sobre o tema junto às famílias e manter o serviço de transplantes em constante evolução, com foco na qualidade de atendimento, na redução de tempo de espera e no cuidado pós-operatório.
O que se espera no futuro é a continuidade do incremento de plataformas de registro de doação, maior integração entre serviços de saúde e políticas públicas que incentivem a doação, de modo a reduzir as filas e ampliar o acesso a transplantes para mais pacientes no RS.