Toque de resistência: estudante usa boné de formatura para exibir mensagem política. Reprodução: Globo
A crescente fuga de cérebros na ciência americana tem se intensificado com os recentes cortes no orçamento e políticas de imigração mais restritivas. Universidades dos Estados Unidos enfrentam dificuldades em reter talentos, especialmente em áreas cruciais como engenharia e ciência da computação, enquanto China e universidades europeias se apresentam como alternativas atrativas para pesquisadores que buscam segurança e apoio financeiro.
A história de Ardem Patapoutian, um neurocientista que chegou aos Estados Unidos em 1986, exemplifica essa realidade. Fugindo da guerra no Líbano, Patapoutian prosperou academicamente, conquistando um prêmio Nobel graças à sua pesquisa sobre a percepção do tato. Entretanto, a administração Trump afetou seu trabalho ao congelar bolsas federais cruciais para a continuação de suas pesquisas. Patapoutian revelou o impacto dessas decisões, afirmando que os cortes podem resultar em uma significativa migração de cérebros para outros países.
Líderes acadêmicos têm alertado sobre os perigos que essas políticas representam para o modelo científico americano. A diminuição das candidaturas de estudantes estrangeiros em instituições americanas é alarmante: segundo a revista Nature, desde a ascensão de Trump, o número de pedidos de pós-graduação despencou, enquanto a demanda por oportunidades no exterior cresce exponencialmente. Por exemplo, uma universidade francesa teve que fechar inscrições para novas vagas devido ao grande número de pesquisadores interessados.
Marcia McNutt, presidente da Academia Nacional de Ciências, enfatiza que a China está se posicionando como uma alternativa viável para pesquisadores afetados pelas restrições americanas. Segundo ela, o modelo de pesquisa estabelecido nos EUA ao longo das últimas décadas está sob ataque, com o governo cortando orçamentos e restringindo vistos, o que gera um clima de incerteza que afasta talentos internationaux.
As políticas imigratórias rígidas têm gerado insegurança entre os pesquisadores, tornando o ambiente acadêmico americano inóspito. Universidades renomadas, como Harvard, enfrentaram proibições em processos de matrícula de estudantes estrangeiros. A promessa de revisões agressivas nos vistos de estudantes, especialmente dos estudantes chineses, levanta ainda mais preocupações sobre o futuro da pesquisa nos EUA.
O diretor de neurociência da Universidade Johns Hopkins, Richard Huganir, destacou sua preocupação ao afirmar que a perda de estudantes internacionais, que representam 30% de sua força de trabalho de pós-docs e doutorandos, poderia ser devastadora. Muitos pesquisadores estão reconsiderando seu futuro, com uma parcela significativa retornando a seus países de origem, em busca de condições mais favoráveis, como é o caso de jovens acadêmicos indo para a China.
A situação atual não apenas se reflete na diminuição de talentos, mas também na preocupação de que os EUA possam se isolar academicamente. Enquanto muitos pesquisadores buscam segurança em outros países, o sistema de pesquisa americano, que uma vez foi considerado líder global, enfrenta desafios sem precedentes. Para Daphne Koller, fundadora da Coursera e Insitro, a verdade é que seria essencial que os EUA investissem mais em formação local, mas a realidade é que enquanto isso não acontecer, o país deve continuar sendo um destino privilegiado, atraindo os melhores talentos do mundo.