O setor de saúde privada no Brasil está em fase de testes com um novo projeto de interoperabilidade de dados de pacientes, coordenado pelo InovaHC do Hospital das Clínicas da USP. Esta iniciativa pretende permitir que hospitais e laboratórios compartilhem informações médicas com a autorização do paciente, visando a agilidade nos atendimentos e a redução de custos no setor.
Inspirada no conceito de open finance, a proposta do InovaHC tem como objetivo melhorar o uso de dados na saúde, permitindo que, em casos de emergência, médicos possam acessar o prontuário completo do paciente rapidamente. Por exemplo, durante uma viagem a outro estado, um indivíduo poderá autorizar o acesso a suas informações médicas, como alergias e tratamentos anteriores, agilizando o atendimento necessário.
Atualmente, a maioria dos hospitais e laboratórios particulares já possui sistemas digitalizados, que armazenam informações dos pacientes. O desafio agora é implementar a interoperabilidade, ou seja, criar um sistema que permita acesso a dados de saúde entre profissionais de diferentes instituições, tudo com a autorização prévia do usuário. Marco Bego, diretor executivo do InovaHC, explica que a integração só será possível se as informações seguirem padrões comuns.
Dentre as instituições que estão em negociações para participar do projeto-piloto estão hospitais renomados como Sírio-Libanês, Beneficência Portuguesa e Oswaldo Cruz, além das redes diagnósticas Dasa, Fleury e Sabin. O lançamento do primeiro teste está previsto para ocorrer em até 120 dias, e outras empresas também estão sendo convidadas a integrar a iniciativa.
"A interoperabilidade na saúde é um assunto debatido há anos no setor", afirma Bego, lembrando que o Hospital das Clínicas levou anteriormente tecnologia de ultrassonografia portátil para comunidades indígenas, mas enfrentou problemas de compartilhamento de laudos. Ele enfatiza que, ao possibilitar que hospitais tenham acesso rápido às informações dos pacientes, a qualidade do atendimento com certeza será melhorada.
A Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados) também se envolve nas discussões sobre o projeto. Seu diretor executivo, Antônio Britto, menciona que os sistemas de saúde no Brasil, tanto públicos quanto privados, estão defasados. Ele destaca que muitos desperdícios ocorrem pela falta de um uso adequado dos dados existentes, que não são devidamente integrados.
Este projeto é monitorado de perto pelo Ministério da Saúde. Ana Estela Haddad, secretária de Informação e Saúde Digital, observa que o Sistema Único de Saúde (SUS) já conta com uma plataforma de interoperabilidade, a Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS). Ela acredita que a iniciativa do InovaHC pode ser um ponto de partida para a futura comunicação entre os setores de saúde pública e privada no Brasil.
Além das instituições hospitalares, outras como a rede de farmácias RD, as drogarias Raia e Drogasil e a Bradesco Saúde estão em fase de negociação para integrar o projeto. Marcia Ogawa, conselheira do InovaHC, destaca que as farmácias poderão compartilhar dados sobre vacinas e testes realizados, enquanto as operadoras de saúde poderão facilitar autorizações de procedimentos e pagamentos aos hospitais.
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) afirma que a interoperabilidade de dados é essencial para otimizar o uso de recursos e reduzir desperdícios. Para Marina Paullelli, do Idec, o projeto pode aprimorar o acesso à saúde, mas ressalta que deve ser cauteloso com o uso dos dados, evitando práticas abusivas e discriminatórias.
A secretária Ana Estela também se preocupa com a possibilidade de que dados possam ser utilizados como barreiras ao acesso a planos de saúde. Ela enfatiza que o consentimento do usuário sobre o que deve ser acessado é fundamental. A professora Ana Maria Malik da FGVSaúde observa a necessidade de cuidados para que os dados utilizados não sejam uma justificativa para bloquear acessos a convênios.
Marina, do Idec, reforça que a regulamentação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) não avançou na saúde e sugere que a interoperabilidade armazene dados usando o Cartão Nacional de Saúde, resguardando segurança e privacidade dos pacientes. Ela defende a necessidade de que os direitos dos usuários em relação à edição e exclusão de dados sejam sempre respeitados.