Nascimento Histórico na Praia do Forte
No dia 22 de julho, a Praia do Forte, localizada no litoral norte da Bahia, testemunhou um acontecimento sem precedentes: o primeiro nascimento registrado da preguiça-de-coleira do Nordeste (Bradypus torquatus) em um condomínio local. O evento, já notável, ganhou contornos dramáticos quando o filhote caiu da árvore logo após o parto, necessitando de intervenção humana para garantir sua sobrevivência.
Intervenção Humanitária e Resgate do Filhote
Funcionárias do condomínio observaram a situação crítica do recém-nascido, mas foi Carolina Ramos, uma psicoterapeuta e estudante de medicina, quem tomou a frente da situação. "Vi que ele estava praticamente imóvel, ainda preso no saco gestacional, com o rosto coberto. Isso impedia que respirasse. Cuidadosamente, retirei o material que cobria a boca e o nariz, e logo ele começou a se mexer e fazer barulhinhos. Foi uma das experiências mais emocionantes da minha vida", compartilhou Carolina.
Tentativa de Reunião com a Mãe
Logo após o resgate, a equipe do Projeto Conecta Vidas, sob a coordenação de Luciana Franco Veríssimo, chegou ao local com a missão de reunir o filhote com sua mãe, que observava do alto das árvores. "Primeiro, isolamos a área e esperamos que ela descesse. Depois, tentamos levá-lo até ela com uma escada, mas ela não aceitou. Só conseguimos quando realizamos uma captura controlada da mãe e colocamos o filhote em suas costas. Ela o reconheceu imediatamente, comeu a placenta e voltou com ele para a floresta", relatou Luciana. Este ato não só marca um acontecimento histórico, mas é simbólico, pois ocorre simultaneamente ao lançamento do Instituto Preguiça-de-Coleira, focado na proteção da espécie.
Espécie Ameaçada
A preguiça-de-coleira do Nordeste é uma espécie considerada em risco de extinção e é endêmica da Mata Atlântica. A Praia do Forte é o habitat com maior ocorrência da espécie em todo o Brasil, e as atividades de monitoramento do Projeto Conecta Vidas envolvem 14 comunidades que compartilham registros e avistamentos através de um grupo de ciência cidadã. Embora não existam dados científicos definitivos sobre a gestação da espécie, a observação sugere que uma fêmea pode dar à luz a um novo filhote a cada seis meses. Carolina destacou: "Foi um lembrete de como a natureza é frágil e preciosa, e de como temos a responsabilidade de protegê-la quando temos a chance. Naquele momento, eu só pensei em agir com compaixão".
Desafios e Ameaças à Sobrevivência
A espécie está classificada como "Em Perigo" de extinção pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) e enfrenta sérias ameaças como desmatamento, fragmentação do habitat e riscos crescentes em áreas urbanizadas. "Esses animais não conseguem cruzar áreas abertas e, ao tentarem, tornam-se alvos fáceis de predadores e atropelamentos. Em um único bairro da Praia do Forte, por exemplo, oito preguiças morreram eletrocutadas em 2023, o que representa cerca de 10% da população local", comentou Gastón Giné, biólogo e coordenador científico do projeto.
Importância da Conservação
A degradação do habitat, impulsionada pela urbanização e projetos imobiliários, eleva ainda mais os riscos à sobrevivência da preguiça-de-coleira. Menos de 0,02% das florestas que abrigam essa linhagem estão protegidas. Giné alerta que estudos com drones térmicos mostram a extinção da preguiça-de-coleira do Nordeste acontece mais rapidamente do que o imaginado apenas pelo desmatamento. Ele enfatiza a gravidade da situação dizendo: "A sobrevivência da preguiça-de-coleira depende da proteção urgente das florestas e da vida livre. É agora ou nunca".