Estudantes diagnosticados com autismo nível um de suporte estão se mobilizando judicialmente após terem suas solicitações de cotas em universidades federais negadas. Recentes casos que ocorrem em diferentes estados do Brasil evidenciam a falta de diretrizes claras, levando a decisões controversas por parte das instituições de ensino superior.
Na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Júlia Porto Alvarenga, de 20 anos, teve sua matrícula em Ciências da Computação cancelada. A junta médica da universidade contestou seu diagnóstico, alegando que ela apresentava apenas transtorno de ansiedade social, o que resultou na recusa ao benefício das cotas para pessoas com deficiência (PcD). A situação da estudante reflete uma questão mais ampla, onde muitos estudantes autistas enfrentam barreiras para acesso ao ensino superior.
Outro caso emblemático é o de Davi Ramon da Silva, de 22 anos, que, após ser aprovado em Medicina na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), teve dificuldade de matrícula, necessitando de uma ordem judicial para garantir seu ingresso. Em declarações ao g1, ele revelou: 'Tive que provar que o que vivi a vida inteira realmente existe.' Isso demonstra o impacto direto das percepções inválidas sobre o autismo de nível um.
As universidades, ao alegarem que os casos não se enquadravam na Lei de Cotas, levantam preocupações sobre a falta de um instrumento nacional unificado para avaliação de deficiência, conforme reconhece o Ministério dos Direitos Humanos. A UFES afirmou seguir a atual legislação, onde laudos particulares têm valor apenas como indícios, sendo necessária a confirmação através de uma junta médica que siga critérios criteriosamente estabelecidos.
Organizações que atuam em prol dos direitos dos autistas alertam que a situação de negação de matrículas não é uma ocorrência isolada. Guilherme de Almeida, da organização Autistas Brasil, destacou o aumento desses casos em várias universidades, incluindo instituições do Rio de Janeiro e da Bahia. Ele afirma que a situação se torna uma prática comum e representa uma barreira séria aos direitos dos estudantes com autismo.
A especialista Laura Ceretta, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), salienta que as limitações enfrentadas por autistas de nível um muitas vezes não são perceptíveis à primeira vista, mas afetam a vida acadêmica. A ausência de diretrizes nacionais adequadas, que já eram esperadas há anos, contribui para as incongruências nas avaliações e a diversidade de processos em diferentes universidades, o que evidencia a necessidade de uma abordagem unificada e biopsicossocial sobre a deficiência.
Por fim, a professora Patrícia Beltrão, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP), destacou que diagnósticos muitas vezes são tardios para autistas de nível um. Ela acrescenta que isso demanda uma maior atenção e revisão dos processos de inclusão nas universidades. Numa perspectiva mais ampla, a sociedade e as instituições educacionais estão sendo encorajadas a adotar uma visão que priorize a inclusão e o apoio, buscando a melhoria dos mecanismos de avaliação e aceitação dos estudantes com deficiência no ambiente acadêmico.