Os recentes movimentos populares têm chamado a atenção para uma nova dinâmica política no Brasil. A emergência de uma direita mobilizada, especialmente em protestos pela Avenida Paulista, vem colocando em xeque a noção de altruísmo que antes parecia inabalável por parte da esquerda. Esse cenário exige uma reflexão crítica sobre como a militância política interfere na escrita, na busca pela verdade e na promoção de um debate construtivo.
A reflexão se torna ainda mais pertinente em tempos onde o discurso político extrema-se, e o que era antes considerada uma luta pela justiça social agora se torna uma batalha ideológica. A crítica proposta por George Orwell em seu ensaio "Os escritores e o Leviatã" ressalta a importância de manter a independência intelectual na produção escrita, mesmo em contexto de forte polarização política.
Um dos principais obstáculos atuais é a ideia de uma Justiça fratricida, que se desenvolve a partir de uma visão equivocada de que o ativismo progressista sempre traz progresso social. Após os conflitos dos anos 2010, a percepção de que a militância deveria ser vista como uma força altruísta e desinteressada começa a ser desafiada. A direita, agora mais organizada, contesta os parâmetros tradicionais de progresso social, enfatizando que as políticas progressistas nem sempre resultaram na justiça esperada, mas sim em uma divisão cada vez maior dentro da sociedade.
Além disso, a discussão de temas tabus se torna crucial. A ascensão da esquerda nas instituições, como universidades e meios de comunicação, impôs uma visão normativa que acaba excluindo de debate questões tidas como polêmicas. O conceito de que discutir cotas é evidência de racismo ou que dialogar sobre a participação de mulheres trans no esporte caracteriza transfobia, gerou uma resistência significativa que levou muitos a se alinharem ao conservadorismo radical, em resposta ao que percebem como opressão elitista.
Outro ponto sensível é a hipertrofia das identidades políticas. A definição de ser de esquerda ou de direita, que deveria ser uma simples indicação de posicionamento político, transformou-se em um tipo de identidade que exige fidelidade absoluta a um conjunto de normas e valores. Divergir de qualquer um desses postulados pode levar à exclusão do grupo, criando um ambiente de tensão, onde a dissidência é punida e os indivíduos perdem o apoio de suas comunidades.
Em face dessas dificuldades, a mensagem de Orwell ressoa fortemente: a política deve ser encarada pelo escritor com a responsabilidade de um cidadão, sem, contudo, deixar que a produção literária se submeta aos interesses de uma ideologia partidária. O papel do escritor permanece, assim, um espaço de independência crítica e liberdade de pensamento, fundamental para um debate justo e aberto nas sociedades contemporâneas.