A epidemia de mortes de motociclistas no Brasil
A quantidade alarmante de mortes de motociclistas no Brasil, exacerbada pela chamada "cultura dos dez minutos" das entregas rápidas, exige urgentemente atenção e ação. A tragédia é representada na Avenida Niemeyer, no Rio de Janeiro, onde uma curva se tornou um memorial, adornada por cruzes que marcam as vidas perdidas. O Atlas da Violência 2025 revela que as motos foram responsáveis por 38,6% das mortes no trânsito em 2023, sendo necessário conscientizar os consumidores sobre o custo humano dessas entregas apressadas.
A realidade em números
Nesta curva da Avenida Niemeyer, que conecta Leblon a São Conrado, dezenas de cruzes já foram pintadas em homenagem aos motociclistas que perderam a vida naquelas imediações, e o espaço para novas é escasso. O cenário está particularmente grave no Piauí, onde as mortes de motociclistas atingem 69,4% dos óbitos no trânsito, de acordo com dados de 2023.
Intervenções para Mitigar as Mortes
Diversas pesquisas e análises apontam causas para a crescente mortalidade de motociclistas e propõem soluções, como intervenções urbanas, controle de velocidade e qualificação dos motoristas. No entanto, a "cultura dos dez minutos" merece um foco especial. Nos últimos dez anos, a conveniência das entregas tornou-se uma verdadeira obsessão, levando os consumidores a exigirem entregas cada vez mais rápidas, sem considerar o impacto disso na vida dos entregadores.
O custo humano da pressa
Atualmente, entregadores de aplicativos representam entre 60% a 70% das internações graves por acidentes de moto atendidas pelo Hospital das Clínicas da USP. Em comparação, antes da cultura de entregas rápidas, essa proporção era de cerca de 20%. Essa demanda por entregas urgentes acaba por congestionar os hospitais públicos, prejudicando o atendimento a outros pacientes.
Comportamento perigoso no trânsito
Nas grandes cidades, a realidade no trânsito se tornou uma verdadeira praça de guerra, com motociclistas frequentemente violando regras de trânsito. Uma pesquisa realizada pela UFRJ e UFBA indica que 67,6% dos entrevistados admitiram ultrapassar sinais vermelhos. O período laboral dos entregadores é extenuante, com cerca de 70% trabalhando seis ou sete dias na semana e 50% cumprindo jornadas de dez horas ou mais. Além disso, 44,1% relatam ter sofrido pelo menos um acidente de trabalho no último ano, um número alarmante quando comparado com a média da população empregada.
Soluções e perspectivas futuras
A solução para o problema da violência no trânsito não é simples e requer múltiplas abordagens. A regulação das empresas de entrega, assim como ações implementadas em cidades como Espanha, Londres, Nova York e Bangkok, é uma parte do processo. A conscientização dos consumidores é vital; entender que a pressa tem um preço, incluindo vidas perdidas. Cada pedido realizado deve ser acompanhado da reflexão sobre o impacto das escolhas em terceiros e na sociedade. Utilizar o delivery ultrarrápido deve vir acompanhado de responsabilidade e consideração pelo custo humano envolvido.
*Delano Franco, mestre em economia, foi professor da PUC-RJ e FGV-RJ