A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal deve votar nesta quarta-feira (17) o projeto de lei que cria o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (CG-IBS) e regula a última etapa da Reforma Tributária. Caso seja aprovado, o texto seguirá para deliberação no plenário do Senado, onde é exigida maioria absoluta de votos (41). A proposta define a estrutura e as competências do comitê, que terá a tarefa de conduzir a implementação e a transição do atual modelo tributário para o novo sistema, cuja entrada definitiva está prevista para 2033. A ideia central é assegurar o cumprimento das regras e ainda traçar medidas para evitar perdas de arrecadação para Estados e Municípios nos primeiros anos de vigência do novo regime.
O texto foi apresentado em novembro de 2024 e começou a tramitar em março deste ano, com Eduardo Braga (MDB-AM) atuando como relator — assim como ocorreu com o texto da Reforma Tributária. A Câmara dos Deputados já havia aprovado o texto em outubro de 2024 e, diante de mudanças, o Senado precisará reavaliar as alterações antes de encaminhar o projeto para sanção presidencial.
Se o Senado aprovar, o projeto voltará à Câmara para nova análise, onde poderá haver mudanças adicionais. O prazo de tramitação atual não altera o objetivo de consolidar a estrutura do Comitê Gestor do IBS, que será responsável por balizar diretrizes, coordenar a implementação e supervisionar a transição entre os modelos de tributação.
Conforme o relatório apresentado na semana passada, a proposta inicial recebeu 517 emendas. Até então, o relator avaliou 368 dessas emendas, acatando total ou parcialmente 96. Na última semana, surgiram mais 149 emendas ao texto, com 124 apresentadas nos dois dias anteriores, ainda sujeitas a deliberação pelo relator na sessão de hoje.
Missão central do CG-IBS
De acordo com o projeto, o Comitê Gestor do IBS será formado por representantes de estados, do Distrito Federal e dos municípios. Sua missão é uniformizar a interpretação e a aplicação da legislação relativa ao IBS, bem como promover operações administrativas ligadas à compensação, retenção e distribuição da arrecadação do imposto entre entes federativos. Entre as atribuições destacadas estão:
- disciplinar a aplicação padronizada de regimes especiais de fiscalização;
- gerir, em cooperação com a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, o sistema de registro do início e do resultado das fiscalizações do IBS e da CBS;
- harmonizar normas, interpretações, obrigações acessórias e procedimentos relativos às regras comuns aplicáveis ao IBS e à CBS junto ao Poder Executivo federal.
Composição e governança
O CG-IBS, conforme a proposta, terá uma estrutura integrada por Conselho Superior, Secretaria Geral, Assessoria de Relações Institucionais e Interfederativas, Corregedoria, Auditoria Interna e uma Diretoria Executiva, com 9 diretorias operacionais, incluindo as áreas de Fiscalização, Tributação e Tesouraria. No total, serão 54 membros distribuídos em duas种 frentes: 27 representantes de cada estado e do DF indicados por seus chefes do Poder Executivo; e 27 representantes dos municípios e do DF indicados pelos chefes dos Poderes Executivos municipais e distritais. Os integrantes atuarão por um mandato de quatro anos. A proposta também estabelece que 30% dos componentes da Auditoria Interna sejam mulheres, fortalecendo a participação de mulheres na governança do órgão.
Impasse entre entidades municipais pode atrasar a reforma
Durante a tramitação, surgiu um impasse sobre a distribuição das 27 cadeiras destinadas aos municípios. O acordo provisório prevê 13 cadeiras para a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), que reúne municípios com mais de 80 mil habitantes, e 14 para a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), que representa a outra parcela municipal. As indicações deverão ocorrer até 31 de outubro deste ano ou 15 dias após a publicação da lei complementar; a partir de 2026, as indicações ocorrerão por meio de eleições.
O comitê fará reuniões obrigatórias a cada três meses, podendo realizar encontros extraordinários quando necessário. Para aprovar deliberações, o projeto exige a maioria absoluta de representantes, a aprovação de membros de estados e do DF que representem mais de 50% da população brasileira e, em relação aos municípios, a maioria absoluta de seus representantes.
ITCMD: heranças, doações e previdência privada
O relatório também define diretrizes para o ITCMD — Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos — com competência estadual. O ITCMD, ainda não regulamentado por lei nacional, é hoje fechado a legislações estaduais com regras e alíquotas distintas. Um trecho anteriormente incluído na Câmara, que tratava da tributação de heranças oriundas de planos de previdência privada, foi removido na votação. O parecer de Braga propõe esclarecer que o ITCMD não incide sobre valores herdados de previdência privada complementar, seguro, pecúlio ou itens similares. A proposta também prevê que o Senado estabelecerá uma alíquota máxima para o ITCMD, cabendo aos estados fixar alíquotas próprias dentro desse teto.
Impostos especiais e impactos setoriais
Imposto Seletivo para bebidas açucaradas
A proposta introduz o escalonamento da cobrança do Imposto Sobre Bens e Serviços Seletivo (Imposto Seletivo) para bebidas açucaradas. O objetivo é tributar itens considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, com alíquotas superiores àqueles aplicadas ao IBS. A transição ocorrerá de forma gradual entre 2029 e 2033. Além das bebidas açucaradas, cigarros e bebidas alcoólicas também estarão sujeitas a esse regime, conforme o cronograma já previsto anteriormente.
Créditos de ICMS
Outra linha do texto determina o destino dos créditos do ICMS, que será extinto com a criação do IBS. Segundo Braga, as empresas poderão pleitear a compensação desses créditos, que poderá ocorrer para saldos acumulados até 31 de dezembro de 2032. O crédito pode ser usado para abatimento de débitos do IBS ou, se a compensação não for possível, será devolvido financeiramente, de forma parcelada, aos contribuintes.
Serviços financeiros e regime de nanoempreendedor
O parecer também delimita as alíquotas para serviços financeiros, cujos regimes de tributação serão específicos na reforma. Enquadram-se operações de crédito, câmbio, seguros e outros. A transição prevê uma elevação gradual da tributação, iniciando em 10,85% em 2027 e chegando a 12,5% em 2033, correspondendo à soma do IBS e da CBS. Nos casos em que houver cobrança de ISS durante a transição, haverá redução da alíquota aplicável.
O relatório também amplia o regime de nanoempreendedor. A proposta empowers taxistas e caminhoneiros a se beneficiarem da isenção das cobranças do CBS e do IBS, desde que preencham certos critérios. O regime, criado na primeira etapa de regulamentação, atingia apenas motoristas e entregadores de plataformas digitais. Com a mudança, passam a abranger pessoas físicas com receita bruta anual inferior a R$ 40,5 mil — equivalente à metade do teto do Microempreendedor Individual (MEI). O texto específica que a isenção se aplica aos serviços de IBS e CBS, desde que atendidos os critérios, e amplia a flexibilização de cálculo já prevista para motoristas de aplicativo para incluir motoristas e entregadores ligados a empresas físicas, como frentistas, caminhoneiros e taxistas. Segundo Braga, sem essa alteração poderiam surgir disputas judiciais sobre igualdade tributária.
Contencioso Administrativo: Câmara Nacional em foco
Entre as mudanças centrais propostas por Braga está a criação da Câmara Nacional de Integração do Contencioso Administrativo do IBS e da CBS. O objetivo é analisar divergências jurisprudenciais entre os dois tributos. Como a CBS tramitará em âmbito federal, seus processos administrativos fiscais ficarão sob o Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais). Já o IBS, tributo de competência estadual, demandará um órgão semelhante para apreciar controvérsias. A Câmara Nacional será composta por quatro conselheiros da Fazenda Nacional da Câmara Superior de Recursos Fiscais do Carf, quatro membros da Câmara Superior do Conselho Gestor do IBS (dois representantes dos estados e dois dos municípios) e quatro representantes dos contribuintes. Os recursos para a Câmara Nacional podem ser apresentados por contribuintes ou pela Fazenda, desde que dentro de 10 dias úteis.
Essa integração busca reduzir litígios entre as regras do IBS e da CBS, assegurando um caminho único para a resolução de conflitos administrativos. A criação do órgão não altera, no entanto, a necessidade de deliberação do relator sobre as emendas apresentadas até a votação de amanhã, o que pode influenciar o ritmo da tramitação no Senado e, por consequência, o calendário da reforma tributária como um todo.