Os investimentos municipais no Brasil enfrentam um grande desafio: garantir eficiência e justiça na alocação de recursos, evitando assim o reforço das desigualdades sociais. Um estudo recente destaca a importância da distribuição equitativa de recursos públicos, ressaltando que a alocação em áreas ricas, onde há capital privado disponível, pode exacerbar a desigualdade.
O conceito de desenvolvimento proposto pelo Nobel Amartya Sen, expresso em sua obra "Desenvolvimento como Liberdade", enfatiza a expansão inclusiva de liberdades, segurança e oportunidades sociais como fundamentais para o progresso. No contexto atual, é evidente que o Brasil e o estado do Rio de Janeiro estão atrasados nessa pauta, o que demanda uma organização da sociedade para impulsionar cidades que respondam a esse imperativo moral.
Estudos demonstram que o desenvolvimento inclusivo apresenta limites diante de restrições fiscais e desigualdades econômicas. Para que os investimentos em infraestrutura e serviços públicos sejam eficazes, devem ser realizados de forma justa, principalmente em áreas onde o setor privado não atua. Ignorar essa questão pode levar à deterioração da sustentabilidade urbana, agravando a desigualdade e o acesso desigual aos serviços públicos.
O Rio de Janeiro exemplifica esse dilema: com uma população superior a 6 milhões e uma significativa parcela vivendo em favelas, a desigualdade territorial se torna alarmante. De acordo com dados do IBGE, 22% da população da cidade reside em áreas de alta vulnerabilidade socioeconômica. O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal revela uma discrepância acentuada, com índices de 0,9 na Zona Sul e 0,74 na Zona Oeste, evidenciando essa disparidade.
A escassez de recursos orçamentários também é uma preocupação. A Controladoria-Geral do Município reportou uma dívida consolidada de R$ 17 bilhões ao final de 2024. Apesar de um orçamento total que atinge R$ 46 bilhões, as limitações fiscais impõem restrições nos investimentos, como demonstrado pela previsão de apenas R$ 3,5 bilhões na lei orçamentária de 2024.
Um exemplo emblemático do dilema distributivo é o caso do Jardim de Alah, localizado entre Leblon e Ipanema. Apesar de sua localização privilegiada, essa área aguardava revitalização há anos, tornando-se um espaço negligenciado. Para enfrentar o abandono, a revitalização foi confiada a investidores privados, resultando em um projeto que, apesar de atender a demanda, causou atração de protestos de moradores. A proposta inclui a revitalização do espaço público em troca de investimentos comerciais.
Esta comparação entre áreas como Realengo e Leblon mostra que a aplicação de recursos públicos tem resultados distintos: em locais vulneráveis, pode promover inclusão e coesão social, enquanto em áreas mais ricas tende a reforçar desigualdades. Portanto, as políticas públicas precisam evitar a influência de interesses privados e focar em diagnósticos baseados em dados robustos, visando diminuir desigualdades e ampliar o bem-estar, com responsabilidade fiscal e eficiência na alocação.
*Manuel Thedim, economista, é diretor executivo do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade.