O recente embate entre o Poder Legislativo e o Executivo, culminando na derrubada do decreto do governo Lula que aumentava o Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF), não apenas expôs a relação tensa entre as duas esferas de poder, mas também evidenciou a influência de interesses corporativos e eleitorais nas decisões do Congresso.
Alberto Aggio, professor de ciências políticas da Unesp, afirma que essa relação é preocupante e tende a se agravar, especialmente devido à independência que os parlamentares conquistaram sobre as verbas do Orçamento. Esse cenário ficou particularmente evidente no primeiro semestre, onde o Legislativo demonstrou um poder considerável ao alocar recursos, frequentemente direcionados para suas bases eleitorais, perpetuando uma narrativa de que estão servindo ao país. "Mas isso é apenas uma meia verdade, uma verdade instrumental," ressalta Aggio, aludindo aos 50 bilhões de reais do Orçamento que foram destinados a estados e municípios por meio dos deputados e senadores.
Esses recursos têm sido fundamentais na reação dos parlamentares ao decreto que propôs um aumento nas alíquotas do IOF. A votação nesse caso funcionou como um aviso ao governo, sinalizando que a Câmara não irá aceitar a proposta de desobrigar o pagamento das emendas individuais, que têm sido obrigatórias desde 2015. O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a debater a possibilidade de tornar essas emendas não-impositivas, o que foi abordado em sessão conduzida pelo ministro Flávio Dino, que tem trabalhado para aumentar a transparência nas emendas desde que Lula iniciou seu terceiro mandato.
Segundo Aggio, a fragilidade do governo Lula no Congresso resulta na falta de um projeto claro para o país. Os parlamentares atuam de forma pragmática, realizando negócios com o dinheiro público que nem sempre são republicanos. Esse comportamento não contribui para a saúde da República ou da democracia e intensifica a desconexão entre governantes e governados.
Além disso, os deputados e senadores têm enfrentado críticas por despriorizar projetos relevantes, favorecendo pautas que atendem a interesses corporativos. Um exemplo evidente disso é o projeto que permite a parlamentares acumular aposentadorias de congressistas com o salário atual, introduzindo um novo ônus financeiro. A recente aprovação para aumentar o número de deputados de 513 para 531 resulta em um custo adicional estimado em 65 milhões de reais anuais.
Esse cenário aponta para um profundo desafio que o Congresso brasileiro precisa enfrentar, a fim de restabelecer a confiança da população e reequilibrar a relação com o Executivo. A construção de uma verdadeira narrativa de serviço ao país requer responsabilidade e transparência em sua atuação.