Inflação em queda reitera o papel da autonomia do BC
O mês de agosto registrou deflação de zero vírgula onze por cento, segundo o IBGE, o que evidencia a eficácia da política monetária restritiva adotada pelo Banco Central. Embora a inflação acumulada em doze meses permaneça em cinco vírgula treze por cento, acima do centro da meta de três por cento e do teto de quatro vírgula cinco por cento, a trajetória mensal tem apontado queda consistente desde fevereiro, reflexo do aperto nos juros implementado pela autoridade monetária sob a gestão de Gabriel Galípolo.
Autonomia institucional e a resistência a pressões externas
A estabilidade inflacionária só tem sido viável pela autonomia conferida ao BC, que lhe permite manter o foco em controlar as expectativas, resistindo a pressões por alívio monetário. Em contraste com declarações públicas feitas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que insinuou que Galípolo facilitaria a conjuntura de juros, a primeira reunião sob o comando de Galípolo consolidou um aperto adicional: a taxa Selic subiu um ponto percentual, atingindo treze vírgula vinte e cinco por cento. Desde então, o aperto foi suficiente para levar a Selic a quinze por cento, patamar considerado necessário para manter as expectativas inflacionárias sob controle.
Conforme registro, Lula chegou a afirmar que Galípolo iria
consertar a taxa de juros, mas a condução rigorosa da política monetária permanece como linha mestra, contrastando com críticas anteriores feitas quando o BC era presidido por Roberto Campos Neto. Felizmente, em vez de atacar o chefe da autoridade monetária, Lula parece ter esquecido o assunto neste momento.
Riscos externos: tarifas, comércio global e inflação
Claro que os juros continuam elevados e a inflação continua a ser motivo de preocupação. Duas variáveis trazem incertezas para o futuro. A primeira é a reconfiguração do comércio global após o tarifaço promovido pelos Estados Unidos. Não se sabe ao certo o impacto das tarifas sobre preços de mercadorias e serviços — mas é evidente que ele não será nulo. É importante, portanto, que a inflação tenha assumido uma trajetória de queda, abrindo certa margem para ajustes futuros nos juros, se necessário.
A segunda variável é a crise fiscal endêmica, semeada pelo governo Lula, com beneplácito e cooperação do Congresso. O BC precisa permanecer vigilante. Existem recorrentes exemplos de surtos inflacionários deflagrados no Brasil por políticas expansionistas, que privilegiaram a geração de renda e empregos sem consolidar responsabilidade fiscal. Conduzir uma economia apenas na base da “vontade política” resulta em inflação, alta de juros, recessão e desemprego — o oposto do que desejam os voluntaristas.
Política fiscal, juros elevados e atividade econômica
O Planalto, por ortodoxia ideológica, resiste a executar uma política fiscal responsável que contribua para reduzir as pressões inflacionárias. Paradoxalmente, essa resistência tende a manter os juros altos por mais tempo — e isso se reflete na queda da atividade econômica, já observada nos dados de emprego e no crescimento do Produto Interno Bruto. A análise sugere que sem um arcabouço fiscal sustentável, a inflação pode permanecer sob controle apenas com juros elevados, deixando a recuperação econômica vulnerável a choques.
É um alento que a autonomia do BC tenha permitido atravessarmos a pressão inflacionária com maior segurança até que os Estados Unidos enfrentem diferentes pressões macroeconômicas. No Brasil, a ponte entre dois governos ideologicamente antagônicos, com Campos Neto substituído por Galípolo, contribuiu para sedimentar na prática a autonomia institucional, fator decisivo para a trajetória de queda da inflação.
Perspectivas futuras e implicações amplas
O cenário ainda traz incertezas: as dinâmicas globais, a evolução da política fiscal e o comportamento das expectativas continuarão a moldar o ritmo do ajuste monetário. Em linhas gerais, a autonomia do BC é vista como elemento central para ancorar a inflação, conferindo espaço para calibrar juros conforme o ambiente doméstico e externo se transforma. Enquanto isso, o ambiente político deverá enfrentar o desafio de alinhar as metas fiscais com a necessidade de manter condições para o crescimento e o emprego, sem abrir mão da credibilidade da autoridade monetária.
Neste contexto, a institucionalidade do BC aparece como variável crucial para a sorte econômica do país: sem autonomia, a inflação tende a responder a pressões políticas, elevando os custos financeiros e comprometendo a atividade econômica. Com Galípolo ao leme e uma agenda que privilegia a responsabilidade macroeconômica, o choque inflacionário recente dá sinais de que a política monetária pode manter a trajetória de queda das pressões de preço, desde que haja consistência entre política fiscal, orientação cambial e conduta institucional.