O Espírito Santo se firmou como referência mundial na produção de especiarias, com o município de São Mateus, no Norte Capixaba, consolidando-se como o maior produtor de pimenta-rosa do mundo e o maior produtor de pimenta-do-reino do Brasil. A agricultura familiar é o pilar desse desempenho, respondendo por 76% das propriedades dedicadas ao cultivo. Em 2024, São Mateus produziu mais de 26 mil toneladas de pimenta-do-reino, correspondentes a 35% da safra estadual; ao todo, o estado somou 73,4 mil toneladas, cerca de 60% da produção brasileira.
Panorama da produção e participação local
São Mateus se destaca em dois condimentos com forte demanda internacional: a pimenta-do-reino e a pimenta-rosa. A combinação de clima propício, solo fértil e o empenho da agricultura familiar criou uma base sustentável para os dois cultivos.
O produtor rural Erasmo Negris cultiva cinco hectares de pimenta-do-reino na cidade. Da propriedade, saem 15 toneladas por ano, exportadas para outros estados e para fora do Brasil.
“Aqui o clima é propício em relação aos trópicos e a pimenta-do-reino se adaptou, se propagou muito bem. São Mateus, por essência, tem alta produtividade e o solo favorece”, disse Erasmo.
Agroecologia, tecnologia e redes de apoio
Segundo a Secretaria de Agricultura do Espírito Santo (Seag), existem cerca de 11,7 mil estabelecimentos rurais voltados ao cultivo da pimenta-do-reino no estado. A maioria é de agricultores familiares, que têm buscado apoio técnico para aumentar a produtividade e manter a qualidade do produto. “A gente tem vários projetos em parceria com o Incaper e também o apoio de agrônomos autônomos. Temos consultoria técnica contratada e também uma cooperativa que nos dá suporte na aquisição de insumos, na implantação da lavoura e depois na comercialização da safra”, explicou Erasmo.
Além do mercado de condimentos, a cadeia produtiva das pimentas tem alcançado novos segmentos, como perfumaria, cosméticos e óleos essenciais. Fabiana Gomes Ruas, pesquisadora do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), destaca que isso amplia o impacto social e econômico da atividade. “A importância social é grande porque muitas famílias participam tanto do extrativismo como do cultivo. Nós temos indústrias de exportação e também iniciativas locais de aproveitamento dos produtos e coprodutos, como óleos essenciais e cosméticos. Outros mercados estão sendo atingidos além do de especiarias e condimentos”, afirmou Fabiana.
Tradição que atravessa gerações
A história da família está intrinsecamente ligada às especiarias. Ana Paula Martin Machado, produtora rural, relembra que a fazenda foi a primeira a plantar pimenta-do-reino em grande escala no Brasil, com mudas vindas de Tomé-Açu, no Pará, e que a pimenta-rosa também foi descoberta na região. “A fazenda tem área de indústria, nós fazemos doce de macadâmia com pimenta-jamaica, gelato, biscoito e o mix de especiarias, que é o único do mundo com as quatro pimentas do mesmo tamanho: jamaica, rosa, branca e preta. Nós iremos começar a produzir agora óleo essencial da pimenta-do-reino e da rosa”, comentou Ana Paula.
Hoje, a propriedade diversificou a produção e já investe em produtos industrializados para ampliar o alcance comercial, mantendo viva a tradição de família que sustenta o cultivo.
Selo de qualidade e reconhecimento
O orgulho local vem do selo de Indicação Geográfica (IG) concedido à pimenta-rosa de São Mateus, que garante autenticidade e valor agregado ao produto. Para a pesquisadora Fabiana Ruas, o diferencial está na combinação de fatores naturais, como o ecótono de restinga, com o saber das comunidades. “Temos aqui em São Mateus um ecótono, ou seja, ambiente de restinga ligado com solo de baixada litorânea, portanto bem drenado, muito favorável ao cultivo da pimenta-rosa. Aqui ela encontrou o local ideal: água na medida certa, solo bem drenado, sol e o saber das comunidades que desenvolveram o know-how de trabalhar com a cultura”, explicou Fabiana.
Perspectivas e impactos futuros
Ao consolidar a liderança em duas especiarias de alto valor, o Espírito Santo consolida uma trajetória de crescimento associada à agroecologia, tecnologia de cultivo e cooperação entre produtores. A expansão de cadeias de valor, com inserção de ingredientes em cosméticos e óleos essenciais, sinaliza novas oportunidades para famílias agrícolas, cooperativas e indústrias locais, mantendo o protagonismo regional diante de mercados internacionais cada vez mais exigentes.